quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

segundos

Segundos de nossas vidas
Estantes assistido de nós mesmos
 E outros nós
De palavras ditas e não ditas            
Cenas fotografadas em nossos pensamentos
Querendo sair de nossas mentes pensantes
Para que outras mentes não pensantes
Possam ter segundos acumulados
De sonhos sonhados na vida vivida
Segundos e segundos
Acumulados de sonhos da vida,
Sonhando a vida
Do sonho vivido
                                                                          

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Álvares de Azevedo


Foi por ti que num sonho de ventura
A flor da mocidade consumi...
E às primaveras disse adeus tão cedo
E na idade do amor envelheci!

Vinte anos! derramei-os gota a gota
Num abismo de dor e esquecimento...
De fogosas visões nutri meu peito...
Vinte anos!... sem viver um só momento!

Contudo, no passado uma esperança
Tanto amor e ventura prometia...
E uma virgem tão doce, tão divina,
Nos sonhos junto a mim adormecia!
 
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Quando eu lia com ela... e no romance
Suspirava melhor ardente nota...
E Jocelyn sonhava com Laurence
Ou Werther se morria por Carlota...

Eu sentia a tremer e a transluzir-lhe
Nos olhos negros a alma inocentinha...
E uma furtiva lágrima rolando
Da face dela umedecer a minha!

E quantas vezes o luar tardio
Não viu nossos amores inocentes?
Não embalou-se da morena virgem
No suspirar, nos cânticos ardentes?

E quantas vezes não dormi sonhando
Eterno amor, eternas as venturas...
E que o céu ia abrir-se... e entre os anjos
Eu ia despertar em noites puras?

Foi esse o amor primeiro! requeimou-me
As artérias febris de juventude,
Acordou-me dos sonhos da existência
Na harmonia primeira do alaúde.
 
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Meu Deus! e quantas eu amei... Contudo
Das noites voluptuosas da existência
Só restam-me saudades dessas horas
Que iluminou tua alma d'inocência.

Foram três noites só... três noites belas
De lua e de verão, no val saudoso...
Que eu pensava existir... sentindo o peito
Sobre teu coração morrer de gozo.

E por três noites padeci três anos,
Na vida cheia de saudade infinda...
Três anos de esperança e de martírio...
Três anos de sofrer — e espero ainda!

A ti se ergueram meus doridos versos,
Reflexos sem calor de um sol intenso,
Votei-os à imagem dos amores
Pra velá-la nos sonhos como incenso.

Eu sonhei tanto amor, tantas venturas,
Tantas noites de febre e d'esperança...
Mas hoje o coração parado e frio,
Do meu peito no túmulo descansa.

Pálida sombra dos amores santos!
Passa quando eu morrer no meu jazigo,
Ajoelha ao luar e entoa um canto...
Que lá na morte eu sonharei contigo.
 
12 de setembro, 1852.

O Poço

Cais, às vezes, afundas
em teu fosso de silêncio,
em teu abismo de orgulhosa cólera,
e mal consegues
voltar, trazendo restos
do que achaste
pelas profunduras da tua existência.

Meu amor, o que encontras
em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos,
rancorosa e ferida?

Não acharás, amor,
no poço em que cais
o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado,
um beijo mais profundo que esse abismo.

Não me temas, não caias
de novo em teu rancor.
Sacode a minha palavra que te veio ferir
e deixa que ela voe pela janela aberta.
Ela voltará a ferir-me
sem que tu a dirijas,
porque foi carregada com um instante duro
e esse instante será desarmado em meu peito.

Radiosa me sorri
se minha boca fere.
Não sou um pastor doce
como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo
terras, vento e espinhos das montanhas.

Dá-me amor, me sorri
e me ajuda a ser bom.
Não te firas em mim, seria inútil,
não me firas a mim porque te feres.

( Pablo Neruda )
Meu Sonho

Eu
Cavaleiro das armas escuras,
Onde vais pelas trevas impuras
Com a espada sangüenta na mão?
Por que brilham teus olhos ardentes
E gemidos nos lábios frementes
Vertem fogo do teu coração?

Cavaleiro, quem és? o remorso?
Do corcel te debruças no dorso.
E galopas do vale através.
Oh! da estrada acordando as poeiras
Não escutas gritar as caveiras
E morder-te o fantasma nos pés?

Onde vais pelas trevas impuras,
Cavaleiro das armas escuras,
Macilento qual morto na tumba?.
Tu escutas. Na longa montanha
Um tropel teu galope acompanha?
E um clamor de vingança retumba?

Cavaleiro, quem és? - que mistério,
Quem te força da morte no império
Pela noite assombrada a vagar?

O Fantasma
Sou o sonho da tua esperança,
Tua febre que nunca descansa,
O delírio que te há de matar!. 

( Álvares de Azevedo )

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Infância

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre  mangueiras.
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que  aprendeu
a ninar nos longes da senzala - nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.

Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu...Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro...que fundo!

Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.
Carlos Drummond de Andrade

DESEJOS

Desejo a vocês...
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho.
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu
Carlos Drummond de Andrades